segunda-feira, 7 de abril de 2014

WANDINELMA ABRE O JOGO, Juíza afirma: “fui vítima de um relatório fantasioso”

Aposentada compulsoriamente em 2011, Wandinelma conseguiu reverter condenação e contou tudo o que ocorreu nos bastidores do processo.



Antes de iniciar a entrevista, a juíza de Direito Wandinelma Santos fez questão de vestir, orgulhosa, a sua toga de magistrada. 

Oficialmente, ela havia sido impedida de usar a vestimenta nos últimos três anos, por ter sido condenada pelo Pleno do Tribunal de Justiça de Mato Grosso à aposentadoria compulsória, punição administrativa máxima que um magistrado pode sofrer.

No entanto, em novo julgamento realizado pelo Pleno do TJ-MT em março deste ano, determinado pelo Conselho Nacional de Justiça, a punição foi revertida e ela poderá voltar a exercer o cargo de juíza. Só aguarda a definição para qual comarca será remetida.

Acusada de baixa produtividade, emissão de informações falsas à Corregedoria Geral da Justiça e condutas incompatíveis com a magistratura, Wandinelma afirmou ao MidiaJur que, no primeiro julgamento que a aposentou, ela foi “vítima de um relatório fantasioso” elaborado em uma correição realizada em 2004 na Comarca de Tangará da Serra (244 km de Cuiabá), onde comandava a 1ª Vara Criminal.

“A correição foi iniciada 90 dias depois do meu licenciamento, quando a vara estava sob a responsabilidade de outra juíza. E aí, quando a equipe da corregedoria foi realizar os trabalhos no gabinete, encontrou centenas de processos conclusos, para impulso e para decisão. E, em cima desse quadro, que não era da minha responsabilidade, foi elaborado o maldito relatório. Partiu da premissa errada [...] Eu saio, deixo um cenário quase ideal, e 90 dias depois sou chamada de ‘a vergonha da magistratura mato-grossense’”, desabafou a magistrada.

Após ter sido condenada, Wandinelma disse que recebeu muito apoio dos magistrados mais próximos, todavia, a própria Associação Mato-grossense dos Magistrados (Amam) teria lhe dado as costas.

“Fora essas cerca de 10 pessoas, eu não recebi nenhum telefonema. Nem de colegas de primeiro grau, nem de segundo grau. Nem um telegrama de pêsames. A própria Associação Mato-grossense de Magistrados (Amam), na época não emitiu sequer uma nota de pesar. O presidente da associação, questionado por um jornalista, disse: ‘ela não veio pedir apoio’. Eu acredito que congratulações de pêsames não se pede. Nem a Amam me apoiou”, ponderou ela.

A magistrada também argumentou que “teve azar”, pois as investigações e a relatoria do primeiro Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) que tramitou contra ela ficaram sob as responsabilidades de desembargadores que não vieram da magistratura.

“O problema não é o quinto constitucional, mas vir do quinto e não se informar. Tivemos grandes presidentes que não eram juízes de Direito. Agora, Rubens de Oliveira não conhecer a Constituição Federal? Não conhecer o Regimento Interno do tribunal?”, criticou.

Na entrevista da semana, a juíza Wandinelma Santos também falou sobre os bastidores do Procedimento Administrativo Disciplinar que a havia aposentado, os procedimentos que move no CNJ contra os desembargadores Rubens de Oliveira e Márcio Vidal e tudo que passou enquanto esteve do lado de fora do Poder Judiciário. 

Confira os melhores trechos da entrevista:


MidiaJur - Agora que a senhora conseguiu reverter a aposentadoria compulsória e está de volta a magistratura, quando será seu retorno?

Wandinelma Santos 
– Eu devo tomar posse na semana que vem, em alguma comarca do interior de Mato Grosso. Só vou saber disso na próxima segunda-feira, dia 7. 

MidiaJur - O presidente do TJ-MT, desembargador Orlando Perri, passou por Alta Floresta e lá há uma pressão muito grande por um magistrado. A senhora gostaria de atuar por lá?

Wandinelma Santos
 – O trabalho que o desembargador Orlando Perri está fazendo, desde que iniciei na magistratura, ainda não vi nada parecido no sentido de ir perto da população. Existem muitas situações de necessidades de magistrados por todo o Mato Grosso. Alta Floresta é uma delas. Eu fui muito feliz em Peixoto de Azevedo, gostei muito da cidade, da região. Não teria problema algum em ir para Alta Floresta, se lá for reservado para mim. 

MidiaJur - Após a determinação da aposentadoria compulsória, em 2011, como ficou a vida da senhora?

Wandinelma Santos 
– Quando eu recebi a notícia da decisão do tribunal, eu estava em Salvador (BA), porque minha filha estudava lá e eu a estava acompanhando. Eu recebi com perplexidade, nunca passou pela minha cabeça. Não visitei gabinete, não fui conversar com ninguém, não mandei memorial, tamanha a certeza que eu tinha de que a minha verdade, se lida, seria avalizada. Em um primeiro momento senti perplexidade, dor, mas no dia seguinte eu já tinha certeza técnica de que o julgamento tinha sido nulo devido a um quórum, entre aspas, desqualificado no sentido técnico da palavra. E aí eu passei a estudar a matéria e, nessa pesquisa, cheguei a ter contato com um dos grandes mestres do Brasil nessa área, que é o Dr. Mauro Gomes de Matos, advogado do Rio de Janeiro, especializado na área de Direito Administrativo e até então o único que havia escrito sobre Processo Administrativo Disciplinar contra magistrados.

Eu fiz contato com ele e ele se propôs a protocolar uma medida no CNJ, uma vez que ele entendia que recorrer aqui seria “chover no molhado”, pois ninguém do Pleno do TJ sequer pediu vistas dos autos. Ele entrou com um procedimento em Brasília, e na época eu expliquei a ele que eu não tinha nenhuma condição financeira de pagar os honorários que ele merecia, uma vez que a aposentadoria trouxe uma perda brutal de ganhos. E ele disse que não ia me cobrar nada, porque ele não suportava ver uma injustiça. Da metade da tramitação do processo para a frente, o meu filho caçula passou a acompanhar. Graças a esses dois anjos eu consegui que esse processo que me aposentou fosse anulado por unanimidade no CNJ. 

MidiaJur – Como os magistrados, servidores e a própria sociedade reagiram com a sua condenação? Houve algum tipo de situação em que a senhora foi apontada ou passou por algum momento humilhante?

Wandinelma Santos 
– Por parte de colegas recebi muito apoio. Mas é humilhante você entrar no Google e ver seu nome em páginas e páginas, mostrando uma biografia que não é a sua. Isso é humilhante, é dolorido. Com relação a magistrados, tive amigos verdadeiros que me prestaram todo tipo de apoio, outros que eu nem tinha muito contato mas que se dispuseram a ser minhas testemunhas. Fora essas cerca de 10 pessoas, eu não recebi nenhum telefonema. Nem de colegas de primeiro grau, nem de segundo grau. Nem um telegrama de pêsames. A própria Associação Mato-grossense de Magistrados (Amam), na época não emitiu sequer uma nota de pesar. O presidente da associação, questionado por um jornalista, disse: “ela não veio pedir apoio”. Eu acredito que congratulações de pêsames não se pede. Nem a Amam me apoiou. 


"Eu saio, deixo um cenário quase ideal, e 90 dias depois sou chamada de “a vergonha da magistratura mato-grossense”
MidiaJur – Como começou toda essa situação que resultou na aposentadoria compulsória?

Wandinelma Santos
 – Tudo nasceu de um equívoco imenso que desandou nessa violência sem tamanho que eu passei. Na época, foram determinadas correições ordinárias em todas as comarcas do interior. Noventa dias antes de iniciar essa correição na Comarca de Tangará da Serra, eu passei por uma perícia no Tribunal de Justiça e a junta médica concluiu que eu deveria ficar afastada, por seis meses, para repouso da voz. Esse laudo foi homologado pela presidência do tribunal, e a presidência determinou que eu me afastasse para o tratamento de repouso da voz. 
 
Imediatamente, eu retornei para a minha comarca. Eu atuava na 1ª Vara Criminal e peguei o pouco que faltava de estoque processual e, no jargão jurídico, eu zerei a vara, não deixei nenhum processo para despachar, nem para sentenciar. A gestora do cartório gerou uma certidão atestando que não havia nenhum processo no estoque e eu encaminhei, por ofício, essa certidão para o então corregedor, desembargador Munir Feguri e entrei para o meu tratamento médico na Capital.

MidiaJur – E foi nessa época que foi feita a correição?

Wandinelma Santos
 - A correição foi iniciada 90 dias depois do meu licenciamento, quando a vara estava sob a responsabilidade de outra juíza. E aí, quando a equipe da corregedoria foi realizar os trabalhos no gabinete, encontrou centenas de processos conclusos, para impulso e para decisão. E, em cima desse quadro, que não era da minha responsabilidade, foi elaborado o maldito relatório. Partiu da premissa errada. Foi tão violento esse relatório que, em um dado momento, o corregedor assina o relatório dizendo que eu era “a vergonha da magistratura mato-grossense”. Eu que tinha saído, deixado meu estoque zerado, baixado o estoque da minha vara em 42%, baixei o estoque substituindo a 2ª vara criminal em quase 30%. Reduzi tanto o estoque das duas varas que essa mesma equipe sugeriu que elas fossem unificadas, porque tinha muito pouco processo. Eu saio, deixo um cenário quase ideal, e 90 dias depois sou chamada de “a vergonha da magistratura mato-grossense”.

MidiaJur – O fato de a senhora não estar atuando naquele momento foi levado em conta?

Wandinelma Santos
 – Mesmo depois que foi concluído que a vergonha da magistratura mato-grossense não era eu, e sim quem deixou aquela lambança, eu não recebi nenhum pedido de desculpas de ninguém até hoje. Esse relatório foi tão equivocado, o corregedor me pareceu que assinou ele sem ler ou prestar atenção, porque o médico que presidiu a junta médica e recomendou o meu afastamento por seis meses, Dr. Carlos Feguri, é irmão do desembargador Munir Feguri. E no relatório, é questionada a lisura do médico. É questionada a veracidade do laudo médico, então ele não deve ter lido, porque senão ele estaria chamando o próprio irmão de falsário. 

MidiaJur – Talvez não teria havido um excesso de confiança em quem produziu o relatório?

Wandinelma Santos
 – Tudo nasceu em cima desse relatório, que foi assinado pelo corregedor, não sei se por excesso de confiança ou excesso de atribuição e deu no que deu. O meu caso foi tão estranho que nem houve a fase de sindicância. Já se abriu diretamente um Processo Administrativo Disciplinar, contrariando a ampla defesa e o processo legal. E esse processo, eu produzi mais de 20 volumes de provas e documentos, todos extraídos do Poder Judiciário nas várias comarcas por onde eu passei. Fui vítima de um relatório tão fantasioso, tão irreal, que uma das acusações mais pesadas feitas contra mim é de eu ter violado o sistema Apolo do tribunal e simulado um número excessivo de audiências em relação ao que eu teria feito na vida real.

MidiaJur - E seria possível violar esse sistema?

Wandinelma Santos
 – As audiências só são realizadas dentro do sistema. Não há como magistrado algum, nem que fosse o Mandrake, gerar um processo fictício, para gerar uma audiência. E com relação a esse item específico, quem prestou depoimento como testemunha foi o hoje presidente do TJ, desembargador Orlando Perri, que atestou que o sistema Apolo era inviolável. Ainda assim, concluiu-se no primeiro julgamento que meu caso deveria ser encaminhado à Procuradoria Geral de Justiça por falsidade ideológica. Foi uma sucessão de absurdos. 

MidiaJur – Também houve suspeitas sobre as visitas ao presídio...

Wandinelma Santos
 - Eu fiz um trabalho em Tangará da Serra para a ressocialização de presos em que eu ia duas vezes por semana ao presídio e levava a situação processual por escrito de cada preso, fosse provisório ou condenado. E nesses relatórios eu projetava as datas dos próximos atos, audiências, sentenças. Acontece que eu não fiz propaganda disso, mas ainda assim chegou ao conhecimento da imprensa e fui homenageada pela Assembleia Legislativa pelas práticas que eu havia implantado. Só que não fiz publicidade disso e não tive a preocupação de anotar no livro de visitas da delegacia, porque eu ia lá constantemente,  e acabei respondendo por falsidade ideológica. Porque o juiz auxiliar era tão despreparado que achou que o magistrado só deveria ir ao presídio quando havia rebelião. Ele foi no presídio nestas datas em que deixei de realizar audiência de réu solto para priorizar réu preso, e entendeu que, como não houve nenhuma rebelião, disse que todo o meu trabalho era uma “mentira deslavada”. 

MidiaJur - Algo que também pesou bastante no primeiro julgamento foi a informação sobre a senhora estar em Salvador na época do Carnaval durante sua licença médica.

Wandinelma Santos
 – Quando eu tirei licença para o repouso de voz, era período de Carnaval. E eu tenho um apartamento em Salvador e fui passar meu aniversário lá, com o meu marido e os meus filhos. Lá, um jornalista me viu em um restaurante, e, para ser cortês, publicou uma nota dizendo que tinha me visto brindar o Carnaval em Salvador. O corregedor da época, desembargador Manoel Ornellas, pegou essa informação e tomou como se fosse a coisa mais grave do Poder Judiciário de Mato Grosso. Não bastou o médico prestar depoimento, não bastou o jornalista dizer que foi uma fórmula que se usa em coluna social, o desembargador Manoel Ornellas quis levar isso até o fim. Em Cuiabá também era Carnaval, se eu estivesse aqui também estaria em um restaurante e não é crime em lugar nenhum do mundo estar fora da cidade onde você mora em licença médica. Graças a Deus, todos os demais membros do Pleno raciocinaram de forma correta e o desembargador Manoel Ornellas ficou falando sozinho. Mas ainda assim, eu era noticiada como a juíza vista no Carnaval de Salvador.

MidiaJur - Com base no seu caso, a senhora acha que deveria haver mais cuidado durante essas correições, principalmente em comarcas do interior, onde as dificuldades são maiores? 
Tony Ribeiro
"Graças a Deus, todos os demais membros do Pleno raciocinaram de forma correta e o desembargador Manoel Ornellas ficou falando sozinho. Mas ainda assim, eu era noticiada como a juíza vista no Carnaval de Salvador"


Wandinelma Santos
 – Isso é, graças a Deus, o que  prega o desembargador Sebastião de Moraes. Nos últimos dois julgamentos que eu assisti, não com relação ao meu caso, ele fala exatamente isso: “se tem problema, devemos verificar o que o juiz está precisando, vamos levar uma força-tarefa para ajudá-lo”. Os juízes são comprometidos com o seu trabalho, ninguém vai brincar com um assunto desses. Como disso o corregedor e outros desembargadores no meu novo julgamento: “muita gente coloca o juiz como bode expiatório de todos os problemas do Poder Judiciário”. Não tem servidor, se tem não tem capacitação, não tem máquina, e o juiz é jogado lá e ele que se vire. Então se deve ter muito cuidado para que não se cometa uma violência desse tamanho. 

MidiaJur - Acredita que possa ter havido má-fé nisso tudo?

Wandinelma Santos 
- Não posso dizer se essa sucessão de equívocos ocorreu de boa ou má-fé, só sei dizer dos estragos que causaram em mim como mulher, como pessoa, como magistrada. O desencanto, a desesperança, a dor da violência e da injustiça. Eu tive um azar nisso tudo. Quem fez o meu relatório de correição, o desembargador Munir Feguri, nunca foi juiz de Direito, ele entrou pela cota da OAB. O relator do procedimento, desembargador Rubens de Oliveira, também nunca foi juiz de Direito, não tem a menor noção do que é ser juiz, do que é comarca, do que é servidor, do que é o sistema Apolo. 

MidiaJur - A senhora então atribui esses equívocos ao fato destes desembargadores terem vindo das vagas do Quinto Constitucional?

Wandinelma Santos
 – O problema não é o quinto constitucional, mas vir do quinto e não se informar. Tivemos grandes presidentes que não eram juízes de Direito. Agora, Rubens de Oliveira não conhecer a Constituição Federal? Não conhecer o Regimento Interno do tribunal? Não tenho nada contra o quinto, só acho que as pessoas que não exerceram o cargo de juiz antes têm que se preparar para exercer este cargo, que é de altíssima complexidade e responsabilidade. 


"O relator do procedimento, desembargador Rubens de Oliveira, também nunca foi juiz de Direito, não tem a menor noção do que é ser juiz, do que é comarca, do que é servidor, do que é o sistema Apolo. "
MidiaJur – Nessa época, a senhora trouxe a tona que o promotor de Justiça Vinícius Gahyva teria tentado grampeá-la. O que de fato ocorreu?

Wandinelma Santos 
– Essa foi uma questão paralela. Esse promotor esteve em Tangará da Serra e não foi só comigo que ele teve problema, foi com outros magistrados também. A ponto de vários magistrados requererem ao desembargador Orlando Perri, então corregedor, que mandasse fazer uma varredura no fórum, tamanha a convicção que todos tinham que nós juízes estávamos sendo grampeados. Foi uma fase muito tumultuada, mas não foi só comigo que esse promotor teve problema, foi com outros magistrados e em outras comarcas. 

MidiaJur – A senhora acredita que o fato de ter sido vítima de uma suposta tentativa de venda de sentenças que poderiam envolver desembargadores possa ter tido alguma influência no julgamento que a aposentou?

Wandinelma Santos
 – As pessoas ligadas a mim, tanto dentro quanto fora do Judiciário, acreditam nisso, que foi uma coisa colada com a outra. Eu já me dou por satisfeita por não ter morrido, como aconteceu com o juiz Leopoldino Amaral, então para mim já está de bom tamanho. Porque, antes de mim, só esse juiz havia falado o que eu falei, denunciado a máfia de venda de sentença em Mato Grosso. Mas, graças a Deus, estou aqui para contar o caso e quem me assediou está em situação complicadíssima. Também ouvi muitos amigos advogados de anos contarem que sofreram assédio de venda de sentença. Mas não adianta falar, se você fala você vira bandido. Ouvi e arquivei, mas as histórias são muitas. E acredito plenamente que isso está mudando e os juízes sendo punidos por tal prática.

MidiaJur - Guarda alguma mágoa de alguém que tenha contribuído para que fosse decidido pela sua aposentadoria naquela época?

Wandinelma Santos 
– Mágoa não, pois isso é peso morto e minha alma é leve. Eu guardo preocupação. Porque se fazem isso com uma magistrada que conhece seus direitos, que tem voz, que tem amigos, que tem uma porta aonde bater, eu não imagino o que pode acontecer com um anônimo. Eu acho que todas as pessoas que me cercaram e acompanharam tudo isso guardam um sentimento de preocupação. 

MidiaJur – Por conta de supostas ilegalidades no julgamento que a aposentou, a senhora move um processo no CNJ contra os desembargadores Rubens de Oliveira e Márcio Vidal. Quais são os argumentos?

Wandinelma Santos
 - Eu ingressei com a representação no CNJ contra o desembargador Rubens e contra o desembargador Márcio Vidal por questão da violação do princípio da isonomia. Na vara da minha colega, a juíza Tatiane Colombo, a situação encontrada foi gravíssima, com pelo menos 20 presos cumprindo pena exacerbada por falha técnica na elaboração da sentença. Foi detectado que a magistrada tomou posse e baixou uma ordem de serviço suspendendo a tramitação da 1ª Vara, a que eu atuava e na época estava de licença. Por isso a equipe chegou lá e tinha centenas de processos. Eu sofri toda essa violência da aposentadoria compulsória por conta de 19 audiências com réus soltos que eu não realizei. E ela suspendeu a vara toda durante meses e não foi sequer processada. E eu que era considerada a vergonha da magistratura continuei a ser massacrada. 

MidiaJur - Agora que está de volta à magistratura, pretende retirar ou continuar com os processos?

Wandinelma Santos
 – Eu pretendo dar prosseguimento, pois é um mecanismo legal que tenho à disposição. Eles não foram corretos comigo na medida em que o desembargador Rubens votou pela 
Tony Ribeiro
Denúncia de venda de sentença: "Eu já me dou por satisfeita por não ter morrido, como aconteceu com o juiz Leopoldino Amaral, então para mim já está de bom tamanho"
não instauração de processo contra essa colega que cometeu coisas gravíssimas. E o desembargador Márcio Vidal, como corregedor, na sessão que analisou o caso da Tatiane Colombo, disse “peço vistas dos autos pois tratam de oito substanciosos volumes e, como se trata de colega, é bom que mais alguém veja”. No meu processo eram 30 volumes e ele não fez o mesmo pedido. E mais, ele disse que todas as faltas da juíza Tatiane Colombo deveriam ser atribuídas a mim, pelas minhas “licenças médicas temerárias”. Ora, as “licenças médicas temerárias” foram assinadas pela equipe médica do Tribunal de Justiça e homologadas pelos respectivos presidentes. Aí o desembargador me vem dizer que eram licenças temerárias? Temerária é aventureira, irresponsável, e ele atribuiu isso aos médicos do tribunal. Eu estou fazendo meu dever legal de reparar, para que a minha biografia seja escrita do jeito certo. Fiz para registro, pois mal conheço essa gente e também não quero conhecer de perto. E não achei meu nome no lixo. 

"A história foi muito bem contada pelo desembargador Rubens. Quem ouvisse, acreditava. Porque ele fez um desencadear de fatos que lendo, qualquer um diria que eu merecia ser fuzilada"
MidiaJur - Em seu novo julgamento, o desembargador Sebastião de Moraes, que instaurou a divergência, “abraçou sua causa” por assim dizer e convenceu os demais para reverter a condenação. Acredita que isso foi decisivo?

Wandinelma Santos
 – Minha vida mudou no momento em que o atual corregedor Sebastião de Moraes bradou pela justiça. Ele mesmo me disse: “eu não fiz favor para a senhora, fiz favor para a justiça”. Ele vislumbrou que no julgamento anterior, que eu fui condenada por unanimidade, nenhum dos votantes pediu vistas dos autos. E a história foi muito bem contada pelo desembargador Rubens. Quem ouvisse, acreditava. Porque ele fez um desencadear de fatos que, lendo, qualquer um diria que eu merecia ser fuzilada. O desembargador Sebastião, na função de corregedor, eu penso que ele deve ter se sentido com mais dever de olhar com os próprios olhos. Porque ele é o órgão fiscalizador e orientador e, por conta própria, foi se inteirar do processo. E ele tentou corrigir a injustiça antes feita, porque aquele mesmo Pleno havia julgado e sequer processado a minha substituta por coisas muito mais graves. E foi aí, questionando os “dois pesos e duas medidas”, que o corregedor começou a virar o jogo. Ele externou um voto maravilhoso e a partir daí os demais, muitos deles que já tinham votado contra, voltaram atrás. 

MidiaJur – Outro fato inesperado foi seu filho Tássio Azevedo, um jovem advogado, ter administrado uma causa tão complexa e ter feito sustentação oral para defender a própria mãe no Pleno. Como foi esse momento?

Wandinelma Santos
 – O meu advogado do RJ já estava fazendo uma parceria com meu filho porque nem sempre ele poderia vir para cá. Na época, meu advogado teve um compromisso na Itália e eu nem sabia que meu filho ia fazer uma sustentação oral. Foi uma surpresa para mim. Eu achei que ele iria apenas me acompanhar no julgamento e na verdade ele foi fazer a sustentação oral. Fiquei muito emocionada, pois não tinha a menor ideia de que ele iria fazer isso. Além do orgulho, foi uma benção. Ele foi muito corajoso. 

MidiaJur - A senhora gostaria de agradecer a alguém que contribuiu para a sua volta?

Wandinelma Santos
 - Primeiramente a Deus, que forneceu luz ao meu caminho. Aos meus amigos magistrados, que tomaram seu tempo para depor a verdade, como os desembargadores Orlando Perri e Paulo Lessa. Também aos inúmeros juízes de primeira instância que deporam, advogados, servidores. E registrar que este novo Pleno está mais humanizado e vislumbro um resgate moral. Este novo Tribunal Pleno de Mato Grosso está muito diferente do que era há bem pouco tempo atrás, que era criticado por toda a sociedade. Eu posso assegurar que, no meu caso, justiça foi feita por essas pessoas do Pleno. Sou grata não a eles, que não me fizeram nenhum favor, mas por terem me feito acreditar na justiça dos homens.

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