terça-feira, 27 de maio de 2014

STF: SUPREMA CORTE DAS CONTRADIÇÕES


A semana se encerrou com mais polêmicas em torno das divergências profundas entre as decisões das Cortes Máximas do país. Por resolução do TSE (forjada, sobretudo, por Dias Toffoli e Gilmar Mendes), o Ministério Público ficou impedido (por um tempo) de investigar crimes eleitorais, sem aprovação prévia do juiz. O STF derrubou esse obstáculo absurdo, posto que o juiz não tem nada a ver constitucionalmente com o desencadeamento da apuração dos fatos delitivos. Como terceiro imparcial, a ele compete controlar os excessos e os abusos de todas as investigações. Por si só, essa já é uma grande missão reservada ao juiz. Mais do que isso significa transformá-lo num superman, dono do que vai se investigar e, depois, dono do que se vai julgar. Na Inquisição era assim, mas a historiografia não lhe reserva encômios nem muito menos há registro de que os sábios e prudentes tenham saudades desse tempo arbitrário, cruel e desumano.

Antes o STF já havia exposto suas entranhas aporéticas (controvertidas) no caso do deputado Eduardo Azeredo, que renunciou ao mandato de deputado nas vésperas do seu julgamento criminal na Corte. Quando Donadon fez isso em 2010 o STF não titubeou e prosseguiu o julgamento. Mesma situação, com medidas emanadas de réguas diferentes. Para a segurança jurídica isso é terrível. A polêmica da perda do mandato do parlamentar condenado pelo STF não foi menos desgastante. No caso mensalão do PT decretou-se essa perda. Logo em seguida o STF mudou de entendimento, para dizer que essa tarefa compete à Casa Legislativa respectiva. Os zigue-zagues ou os “vaivéns”, frequentes no condutor embriagado, são mortais para a credibilidade da Justiça.

Mas o troféu da Justiça zigue-zagueante, nesta semana, ficou por conta do ministro Teori Zavascki, que cometeu (data vênia) dois erros: (a) não ter seguido os precedentes de Lewandowski (caso Demóstenes) e de Marco Aurélio (caso da corrupção no metrô de SP), que corretamente só ficaram com as investigações dos réus com foro privilegiado pela função, deixando com o juiz de primeiro grau a investigação dos outros implicados, sem foro especial; (b) ter liberado um dos réus do caso Lava Jato, um ex-diretor da Petrobrás, sem ter fixado uma altíssima fiança para garantir eventual ressarcimento dos danos causados pelo desvio do dinheiro público.


Praticamente desde o seu nascimento o STF nunca primou pela unificação sólida dos vários entendimentos que pululam em seu seio. Nas últimas décadas, no entanto, a situação se agravou sobremaneira por inúmeras razões, a começar pela quantidade exorbitante de processos (nossa Corte é recordista mundial nesse item, com mais ou menos 100 mil processos anuais), que passou a demandar uma enxurrada de decisões monocráticas, que transformam cada ministro num pequeno Supremo Tribunal Federal. O que está programado para ser julgado por apenas onze ministros (input) é desproporcionalmente maior que a capacidade de vazão desses processos (output). Conclusão: congestionamento inevitável, morosidade e decisões flagrantemente contraditórias, o que constitui uma preocupante causa de insegurança, que confirma o achado sociológico de que vivemos uma típica e desorientada sociedade de massas rebeladas (Ortega y Gasset), que recusam os governantes e suas instituições representativas, como a Justiça, procurando agir de forma direta, ou seja, fazendo justiça com as próprias mãos. Os linchamentos, que no nosso país têm alta vinculação com o descrédito das instituições públicas brasileiras, são a expressão mais cristalina de que realmente vivemos numa sociedade doente, combalida e altamente degenerada.




LUIZ FLÁVIO GOMES. Jurista e diretor-presidente do Instituto Avante Brasil.

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